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Linguagem e Ensino - Exercícios de Militância e Divulgação
João Wanderley Geraldi
Trata-se de uma coletânea de textos escritos entre 1991 e 1994 que giram em torno da linguagem e do seu ensino, todos eles buscando um único interlocutor, o professor, organizados pelo autor em três grupos: primeiramente, os textos que tratam do ensino da língua materna; depois, textos que tratam mais especificamente da leitura; e, finalizando, de textos que apontam para um trabalho com base em textos produzidos por alunos. Os textos, segundo Geraldi, mostram suas preocupações, sua militância como professor universitário engajado em projetos de formação, onde – recorrendo a Paulo Freire – revela coerência com a opção política que assume.
Parte 1
Sobre o ensino de língua materna
1.O ensino e as diferentes instâncias de uso da linguagem
Neste texto, Geraldi argumenta que o estudo e o ensino de uma língua não podem deixar de considerar as diferentes instâncias sociais, pois os processos interlocutivos se dão no interior das múltiplas e complexas instituições de uma dada formação social. A língua, enquanto produto desta história e enquanto condição de produção da história presente, vem marcada pelos seus usos e pelos espaços sociais destes usos. Por conta disso, a língua nunca pode ser ensinada como algo pronto, acabado, fechado em si mesmo.
Ao olhar para a história da educação, Geraldi conclui que a preocupação com a linguagem, com o ensino da língua, não resulta da existência da escola, mas, pelo contrário, que a escola pode ter surgido justamente para atender a uma preocupação muito específica com a linguagem. A aprendizagem da linguagem que convence atravessa séculos justamente por ser uma necessidade das diferentes classes dominantes na história.
Para Comenius, a escola e a sua universalidade poderiam ser o contraponto ao poder de persuasão e convencimento do discurso (da palavra que convence) de posse, até então, das classes dominantes. Até porque a linguagem teria outra finalidade a ser buscada, a de guia para outras aprendizagens. Tendo como perspectiva que o objetivo da escola é a transmissão de conhecimentos, o domínio da linguagem permitiria o acesso a outros conhecimentos. Geraldi atenta, entretanto, para o risco presente nesta visão instrumental do ensino de língua que acaba por separar forma de conteúdo – como se houvesse dois momentos: um primeiro em que se aprende a linguagem e um segundo em que se aprende o conteúdo transmitido por essa linguagem – que é creditar legitimidade, conhecimento, somente aqueles que dominam a linguagem, com expressões, muitas vezes, totalmente alheios ao grupo social a que pertencem, no qual também se produz conhecimento a partir de uma outra linguagem, deficitária em relação a linguagem dominante, mas não em relação a ela mesma, uma vez que comunica aquilo que produzem. Encontra-se aqui uma cisão velha conhecida de todos: entre cultura popular e cultura erudita.
A escola se quisesse ser bem-sucedida numa direção diferente daquela em que ela hoje já é bem-sucedida (de discriminação), poderia proporcionar a maior diversidade possivel de interações. O significativo não seria aquilo que é necessário para acessar outros conhecimentos, mas o que encontra ancoragem nos conhecimentos anteriores, construídos em processos interlocutivos que antecederam à entrada na escola e que continuam existindo, fora dela, tendo peso sobre suas vidas e compreensão da realidade. Isto possibilitaria que a visão da linguagem como um repertório pronto e acabado e de um conjunto de regras a automatizar que, muitas vezes, só encontra sentido dentro do próprio espaço escolar, fosse apreendida em interação com o que lhe é externo, não para substituir a educação formal pelo informal, mas para fazer dela um ‘recurso didático’ para permitir que o senso comum, os conhecimentos ingênuos, fossem ao longo do processo de escolaridade sendo substituídos pelos saberes organizados e sistemáticos.
2. O ensino da unidade na diversidade lingüístico-cultural
Neste texto de 1994, fruto de uma mesa-redonda que debatia a aquisição da língua escrita e o ensino da língua materna, Geraldi discute a questão da concepção de linguagem e a questão das variedades lingüísticas. Parte aqui da mesma tese apresentada pelo texto anterior de que não cabe mais apostar num processo de ensino/aprendizagem da língua materna que partisse do suposto da existência de uma língua pronta e acabada nem de que não se trata mais de aprender uma língua para dela se apropriar, mas trata-se de usá-la e, em usando-a, aprendê-la. Começa apontando que a monologia própria dos processos escolares, que limita o mundo ao que é enunciado pela classe dominante, seria um dos principais obstáculos colocados pelo sistema escolar de reprodução de valores sociais à ‘eficiência’ do próprio sistema. Isto é, seria justamente o fato da escola ter como papel inculcar os valores de uma determinada classe sobre a outra que torna o processo de aprendizagem da língua materna um problema.
Geraldi lembra que qualquer falante já vive numa sociedade e numa sociedade que se caracteriza diferentemente em cada época em função das formas como se estrutura, isto é, o fato de obedecermos à determinadas regras em função das instituições no interior das quais falamos. Utiliza como exemplo uma sala de jantar de sua própria família onde ninguém precisa levantar a mão para pedir a palavra, pedir que lhe passem o sal, por exemplo, diferente de uma assembléia ou uma reunião formal, onde antes de falar é preciso inscrever-se e aguardar até que sua intervenção seja permitida.
O aluno traz para dentro da sala de aula o reconhecimento dessas diferentes instâncias, ocorre que a sala de aula é uma ‘instância pública’ de uso da linguagem e, muitas vezes, estes alunos que freqüentam outros espaços, não eram locutores mas interlocutores, compreendem as falas que se produzem nestes espaços, mas não, necessariamente, são falantes nestes mesmos espaços, como por exemplo, um culto religioso, um show de música, para os quais as falas são dirigidas, compreendidas, mas nos quais não se manifestam.
Geraldi identifica que muitas das ‘indisciplinas’ se dá justamente pelo não-domínio das regras de uso da linguagem em situações como as de sala de aula. Justamente porque a linguagem da sala de aula é aquela determinada por uma determinada classe, o que faz com que suas formas de se comunicar, sua linguagem seja estigmatizada pelo não respeito a variedade lingüística o que, por tabela, estigmatiza o próprio sujeito detentor desta linguagem estigmatizada. Entretanto, falantes de diferentes dialetos conseguem produzir compreensões aproximadamente semelhantes aquelas produzidas pelos detentores da ‘variedade culta’. Os alunos provenientes das classes populares falam e compreendem o mundo de um modo que a escola não aceita e às vezes sequer compreende. Neste sentido, a escrita passa a ser usada como forma de ‘normatizar’ a fala: para os letrados, o lugar utópico em que gostariam de estar quando falam (e que se imaginam ocupando quando falam); é o ‘falar como se escreve’ porque a escrita é que seria a ‘língua correta’. Assim, a escrita como ‘língua correta’ agiria dentro do ambiente escolar como a ‘variedade culta’ sobre aquele dialeto que os falantes das classes populares dominam e através do qual são estigmatizados e impedidos de utilizar mesmo que seja para entender a realidade em que se encontram, isto é, sua linguagem e o conhecimento produzido com ela são desconsiderados pela escola, esvaziando o sujeito da sua forma de se comunicar e da sua forma de compreender o mundo. Desta forma, somente aquilo que for transmitido através da ‘língua correta’ ensinada na escola poderia ser considerado também correto.
3. Construção de um novo modo de ensinar/aprender a língua portuguesa
Neste texto, Geraldi, na condição de consultor do Telecurso 2000, discute as Diretrizes para o Aperfeiçoamento do Ensino/Aprendizagem da Língua Portuguesa, elaborado pela Comissão Nacional nomeada pelo Ministério da Educação, em 1986. O documento sugere um ensino centrado em três atividades: a prática de leitura de textos, a prática da produção de textos e a prática da análise lingüística. Para que as práticas propostas não se tornem apenas outro rótulo para atividades tradicionais, Geraldi entende que é preciso retomar os pressupostos que inspiram a proposta, isto é, as contribuições essenciais da Lingüística ao ensino da língua materna. É o que ele faz ao longo do texto começando pela ‘concepção de linguagem’. Para Geraldi, a linguagem é mais do que uma capacidade humana de construir sistemas simbólicos, antes concebe-se a linguagem como uma atividade constitutiva, cujo espaço de realização é a interação verbal. Nascemos num mundo onde nos relacionamos uns com os outros e nesta relação criamos instrumentos para compreendermos e sermos compreendidos.
A língua é uma dessas formas de compreensão, de modo a dar a cada um os sentidos das coisas, das gentes e de suas relações. Recorrendo a Bakhtin, entende que a aquisição da linguagem se dá pela internalização da palavra alheia que é também a internalização de uma compreensão de mundo. As palavras alheias vão perdendo suas origens (ser do outro), tornando-se palavras próprias (internas) que utilizamos para construir a compreensão de cada palavra, ininterruptamente. É a partir disso que Geraldi entende a linguagem como uma atividade constitutiva: pelo processo de internalização do que nos era exterior que nos constituímos como os sujeitos que somos e, com as palavras de que dispomos, trabalhamos na construção de novas palavras. Ou seja, no próprio ato de falarmos estamos, queiramos ou não, participando do processo de constituição da língua.
Outra contribuição da Lingüística que Geraldi traz para o debate são as variedades lingüísticas, isto é, aprendemos a língua no convívio com outros e estando as pessoas ocupando espaços sociais distintos, a variedade lingüística que aprendemos é aquela falada pelo grupo social ao qual pertencemos. Como a divisão social entre os homens não se faz sem conseqüências, também o acesso a herança do passado se dará de forma diferenciada de acordo com o grupo ao qual pertenço. Lembrando que a variedade lingüística é sempre tomada a partir daquela que é falada pelo grupo social dominante, isto é, que detém o poder econômico, político. E esta que também é uma variedade acabou sendo tomada como a base para a construção da escrita. O estranhamento de uma criança pertence a um grupo social desprivilegiado, ao entrar para a escola para ser alfabetizada, resulta também do fato de que o modo de compreender o mundo e sobre ele falar oferecido pela escola é diferente daquele ao qual se habituara nos espaços de convivio do qual participou/ou participa.
Por isso que no processo pedagógico, segundo Geraldi, não se trata de substituir uma variedade pela outra, mas de construir possibilidades de novas interações dos alunos e é nestes processos que o aluno vai internalizando novos recursos expressivos e, conseqüentemente, novas categorias de compreensão do mundo. Dessa forma, aprender a ler é, assim, ampliar as possibilidades de interlocução com o mundo, isto é, com pessoas que jamais encontraremos frente a frente e, para interagirmos com ela de forma satisfatória, precisamos ser capazes de compreender, criticar e avaliar seus modos de compreender as coisas, as gentes e suas relações. Enquanto que escrever é ser capaz de colocar-se na posição daquele que registra suas compreensões para ser lido e entendido por outros, o que significa, interagir com os outros.
Parte II – Sobre a Leitura
4. A Leitura em Momentos de Crise Social
Em um texto escrito para a conferência de abertura da nona edição do Cole – Congresso de Leitura do Brasil, realizada em 1993, Geraldi discute a leitura em momentos de crise social amparado por três textos: um poema escrito por um garoto de nove anos, uma notícia de jornal sobre o esquema PC Farias e uma reportagem da Veja sobre o linchamento de três adolescentes, vítimas inocentes de uma multidão enfurecida.
No primeiro texto, o poema do garoto, Geraldi identifica “um presente que empareda sonhos, que fecha portas, que destrói alternativas, que exclui...” (Geraldi, 1996, p. 85), que faz o autor ter vergonha do presente, daquele mundo presente que o garoto de nove anos obrigado a ler não vislumbra alguma saída, quando diz que para sobreviver precisa ser jogador de futebol embora seu desejo fosse o de ser poeta.
No texto sobre o esquema PC Farias, o jornalista Carlos Franciscato faz as contas de quantos carros ou bancos os ladrões deveriam assaltar para se igualar ao valor obtido pelo tesoureiro de campanha de Fernando Collor. Para Geraldi aqui há a necessidade de no diálogo com os seus alunos mostrar que a leitura mais do que um simples ato mecânico de reconhecimento, é também um processo de construção de compreensões dos objetos, do mundo e das pessoas, da nossa capacidade de se indignar ante o indevido, as atividades ‘pcfarianas’.
Por último, no texto sobre o linchamento, Geraldi mostra como a multidão enfurecida que linchou os três garotos, que acreditou ter feito justiça não sobre os três garotos, dos quais sequer foram vítimas, mas de toda a injustiça, de toda a violência, de toda a criminalidade que presenciam, agem da mesma forma que aqueles dos quais se consideram vítimas, tornam-se criminosos por conta da criminalidade que os ameaça.
5. Políticas de Inclusão em estruturas de exclusão
Compreendendo a leitura como interlocução entre sujeitos e, assim sendo, espaço de construção e circulação de sentidos, impossível descontextualizá-la do processo de constituição da subjetividade, ampliado pelas possibilidades múltiplas de interação que o domínio da escrita possibilitou e possibilita. A partir desta constatação, Geraldi busca em Bakhtin e em Vygotsky, a porta de acesso por que se espera compreender o processo de constituição da subjetividade, isto é, a linguagem. No sentido que a linguagem expressa a experiência vivida nas relações sociais. Isto é, a linguagem enquanto atividade implica que as línguas não se encontrando prontas e acabadas, nos são dadas, portanto, como um sistema de que o sujeito se apropria para usá-las segundo suas necessidades e enquanto ‘instrumentos’ próprios construídos neste processo contínuo de interlocução, carregam consigo as precariedades do singular, do irrepetível, do insolúvel, mostrando sua vocação estrutural para a mudança. Por outro lado, o domínio da técnica escrita ampliou consideravelmente no espaço e no tempo, os horizontes de nossas possibilidades interativas, e, naturalmente, a constituição das nossas consciências.
Uma ‘tecnologia’ tão importante como a escrita não poderia deixar de ser ao mesmo tempo objeto de desejo e instrumento de dominação. Somente a uma minoria estrita o acesso ao mundo da escrita permitiu a façanha da seleção, da distribuição e do controle do discurso escrito, produzindo assim um mundo separado, impenetrável para o não-convidado, aquele que não domina esta ‘tecnologia’ uma vez que esta ‘cidade’ resulta desta mesma ‘tecnologia’. Apoderar-se da letra e da escolaridade que esta ‘cidade’ demanda para existir, resulta de uma luta por parte daqueles dela excluídos não tanto pela ausência da ‘leitura’, da ‘escrita’, mas pela própria condição social em que se encontram. Por isso, Geraldi conclui que apostar em ‘políticas de leitura’ como meras políticas de inclusão, sem associar a elas políticas de transformação e rupturas sociais mais amplas, pode ampliar o contingente dos habitantes desta ‘cidade’, mas não impede que ocupem nela também um papel subalterno.
6. A Propósito do Outro: Imagem, Construção e Cumplicidade
Trata-se de um texto-base para discussões de uma mesa-redonda coordenada pelo autor, onde ele destaca o tema que será debatido entre um escritor, um jornalista e uma crítica literária. Colocando-se na condição de ‘leitor’, Geraldi lembra que o texto produzido completa-se na leitura, aproximando o texto de uma perspectiva interacionista: o texto sozinho não seria responsável pelas significações que faz emergir; o texto é condição para a leitura; mas a leitura vivifica os textos. Embora o leitor busque nessa leitura construir os significados desejados pelo autor do texto que lê, o que faria da sua leitura uma leitura legitimada, deve-se reconhecer que nessa leitura existem outras possibilidades de leitura que não podem ser calculadas pelo autor e que não deixam de ser, por conta disso, leituras legítimas.
7. Algumas funções da leitura na formação de técnicos
Aqui, Geraldi discute a leitura em cursos de formação técnica. Lembra que na escola, não importa a modalidade, a leitura de textos nunca deixou de estar presente e em qualquer disciplina, seja ela técnica ou não. O autor observa que em virtude do curso técnico, professores de língua portuguesa costumam adotar duas posições: uma que insiste na leitura como uma espécie de contrapartida aos trabalhos desenvolvidos pelos alunos nas oficinas profissionalizantes, entendendo que o trabalho ‘embrutece’ os sujeitos, enquanto a leitura de textos literários ‘humaniza’. Uma segunda atitude, perante o mesmo problema, é a adoção nas aulas de língua portuguesa de textos técnicos. Geraldi questiona ambas as soluções: segundo ele, excluir a leitura de textos ficcionais seria contribuir com a eternização da diferença enquanto que excluir a leitura de textos técnicos seria contribuir, da mesma forma, com esta mesma eternização, pois a capacidade profissional (técnica) é um dos maiores instrumentos da classe trabalhadora. Para Geraldi, não se trata de saber qual o tipo de texto mais adequado para ser trabalhado em sala de aula, mas de qual seria o melhor trabalho a ser feito em sala de aula para que os alunos de cursos técnicos sejam cidadãos leitores numa sociedade que tem expulsado, historicamente, os trabalhadores, qualificados ou não, das bibliotecas, das livrarias, dos cinemas, dos teatros etc.
Parte III – Sobre o trabalho com textos produzidos por alunos
8. Ensino de Gramática X Reflexão da Língua
A partir de uma discussão com a filha, quando aluna da quinta série a respeito de uma tarefa dada pela professora de identificar os verbos em um texto, Geraldi descreve como no ensino da gramática o aluno é impedido de refletir sobre aquilo que aprende. Lembra Geraldi que todo falante realiza, em suas atividades lingüísticas, avaliações dos recursos expressivos que emprega: se são adequados para a ocasião, se expressam o que deseja, o que é preciso dizer o que é preciso silenciar, etc. No entanto, as atividades de ensino de gramática não permitem que essas mesmos avaliações sejam feitas, uma vez que se apresenta como a verdadeira e única reflexão possível sobre os recursos expressivos de uma língua. E o que é mais problemático, as análises resultantes das teorias gramaticais que inspiram os conteúdos ensinados são respostas à perguntas que sequer foram formuladas pelo aluno – como conseqüência disso, as respostas nada lhe dizem e os estudos gramaticais passam a ser aquilo que se deve estudar e conhecer sem que saiba muito bem o porque de aprendê-los. Geraldi lembra que o raciocínio classificatório que o aluno realiza no seu cotidiano – separando objetos, guardando roupas no armário, selecionando seus brinquedos, etc – não difere daquele proposto pelos exercícios em sala de aula a respeito dos recursos expressivos da língua. E não consegue compreender justamente porque no seu cotidiano, toda a separação que ele faz é baseado na própria experiência, nos próprios objetivos.
9. A escrita como trabalho: operações e meta-operações de construção de textos
A partir de uma concepção sociointeracionista da linguagem, Geraldi propõe uma compreensão do processo de elaboração de textos como uma forma, materializada na língua, de retorno ao interindividual do que se tornara intra-individual. Assim como um texto que não existe sem materializar-se nos recursos expressivos que nele trabalham; estes, por seu turno, não existem fora de sua remessa a sistemas de referências. Ambos, recursos e sistemas, constituem-se concomitantemente. Ou seja na elaboração de um texto é preciso entender que os recursos expressivos a serem empregados só ganham sentido dentro de um sistema de referências com o qual dialoga, interage, o que significa dizer que este sistema de referências não existiria sem tais recursos expressivos; nem estes seriam recursos expressivos fora deste sistema. Na construção de textos, portanto, mobilizam-se, concomitantemente, estas duas materialidades, concebidas como duas apenas como conseqüência do recorte analítico que releva dos interesses de diferentes programas de pesquisa. Da mesma forma que cada sujeito por constituir-se nos processos interacionais de que participa, não se torna por isso mesmo uma cópia em carbono daquele com o qual interage, ao tornar intra o que antes fora interindividual.
10. Da interpretação de processos indiciados nos produtos
O último texto do livro foi escrito para um debate com pesquisadores de um grupo de trabalho chamado “A Escrita como Trabalho: Tipologia Preliminar das Operações de Refacção de Textos Representativos do Início da Aquisição da Escrita”. Nele Geraldi discorre sobre a questão que se coloca para o pesquisador ante o emaranhado de ‘dados’ que os pesquisadores têm em mãos. Entende o autor que é a condução do olhar a questão essencial que se coloca para o pesquisador, já que é esta condução que definirá diferentes programas de pesquisa e diferentes afiliações teóricas. Afinal, somente um programa de pesquisa que já definiu antecipadamente seus resultados pode abrir mão de perguntar ‘o que ensinam os dados?’. Para aqueles que dispensam esta pergunta, trata-se apenas de buscar os exemplos que melhor ilustrem os pontos de vista e as definições já fixadas.
Disponível em: <http://www.professorefetivo.com.br/resumos/Linguagem-e-Ensino-Exercicios-de-Militancia-e-Divulgacao.html>. Acesso em: 11 Jun 2015.
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